sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Falácia de Inversão no Discurso da Opressão

No intuito de eventualmente me promover de pseudo-intelectual a intelectual de fato (afinal de contas preciso disso pra ser pedante com mais eficiência), estava eu lendo um dos primeiros Diálogos de Platão que se chama Euthifron. O diálogo trata da natureza da piedade e transcorre ao Sócrates questionar a definição dada por Euthifron de que algo é piedoso por ser praticado pelos deuses.

Em determinado momento de seu argumento, Sócrates distingue agentes e objetos na relação de causalidade e sua implicação na definição dos mesmos. Acontece que o objeto ganha seu atributo relativo a ação devido à ação do agente e não o contrário. Por exemplo, um papel se torna rasgado pela ação de um rasgador, neste caso, implicar na relação inversa, isto é, que o rasgador se torna rasgador pelo papel ser rasgado, é incorrer em falácia.

Bom, por que raios este que vos fala resolveu então trazer este argumento aqui? Bom, além de demonstrar meu pedantismo e falar pra todo mundo que eu leio Platão, acho que este passo atras nos fundamentos lógicos pode nos ajudar a entender a patologia do discurso dos agentes sociais opressivos.

O ponto principal deste post é defender que não basta, para os mecanismos de repressão da sociedade, operar por um sistema classificatório performativamente conjurado (por que performativamente? pergunte pra Anita), mas também reforçar a classificação por meio de uma falácia do tipo descrito.

Não entendeu? Acho que nem eu. Um exemplo talvez ajude: não é o fato de um homem ser homossexual que o faz sentir-se atraído por homens, isso é uma falácia! A operação real é a inversa: o fato deste homem só se sentir atraído por homens o torna homossexual. O poder necessita incorrer nesta falácia para incluir o "queer" dentro da classificação e poder assumi-la como real.

Naturalmente, forçar essa falácia guela abaixo serve ao fim de restringir a liberdade individual e justificar a discriminação. Ainda mais naturalmente este processo gera sofrimento psíquico e conflitos sociais.

Algumas consequencias da resolução desta falácia devem ser feitas explícitas: você, meu amigo coxinha, que vive um relacionamento de exclusividade com a sua namorada e trai ela com seja lá quem for, lamento te informar, mas você não é monógamo, por definição. Não que esta classificação (mono vs. polígamo) tenha qualquer importância, mas pelo fato de ser binária e exclusiva (não A implica B e vice-versa) podemos usa-la de maneira explicita para revelar a falácia.

Da mesma forma a implicância com pessoas "assumidas" homossexuais quando pegam alguém do sexo oposto por "se definirem" provém da replicação falaciosa que "homossexuais devem se relacionar apenas com pessoas do mesmo sexo". Aqui neste ponto a pessoa é forçada a entrar em uma classificação, é forçada a se encaixar no esquema da opressão e na sua rede de preconceitos (afinal de contas gay é gay e bi só está passando por uma fase).

Tudo isso pra dizer que os processos opressivos, além de escrotos, são também burros.

Por isso é hoje.

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Xô Satanás

Um comentário:

  1. Seu pedantismo é brilhante. Confesso que também estou a ler sobre metafísica, a fim de me tornar realmente culto e abandonar o pseudo-cultismo, porque, afinal, pseudo-cultismo está na moda, e hipster que é bom está sempre um passo a frente da moda.
    De qualquer forma, creio que o problema metafísico vai mais longe. O sistema opressor metafisico não só impoem a falácia da falsa-causalidade goela abaixo, mas também impõe distância dos fatos cotidianos. Assume-se que quem quer que seja que tenha sofrido qualquer problema do sistema (eg.:, revenge porn) é culpado e exclusivamente culpado pelo problema. O sistema astutamente tira de foco a causalidade: a menina se matou (do caso específico), não porque ela fez um video, nao porque o rapaz mostrou o vídeo para outrem, nem porque outrem o viu; ela se matou porque a sociedade é hipócrita e não tolera que suas vergonhas sejam mostradas em público. Entao as pessoas ridiculaziram, riem e ostralizam qualquer um que exponha a público o vexame que a própia sociedade faz fora das cameras. A falácia é pesada: ela tira o verdadeiro ator do suicídio, a própria sociedade, de posição de destaque, e faz o suicídio ser consequência do ato da garota, de mostrar o vídeo. Por trás das cortinas, o vilão continua agindo.

    enfim, rumo ao verdadeiro cultismo.

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